segunda-feira, 28 de março de 2011

A minha senhora

Eu a vejo ali. Como uma tábua palpitante. Inquieta e persistente. Ávida por chamar minha atençao a todo instante. Lembrando-me de que eu preciso dela. Ela quer que eu precise dela. E eu preciso decidir se preciso dela. E ao precisar decidir se preciso dela, eu deveria agir. Ela espera muito de mim. Ela exige que eu seja alguém especial. Ela corta minhas arestas e me empurra para um lugar desconhecido para mim. E eu preciso saber me adaptar a esse lugar. E preciso decidir se eu posso estar nesse lugar. Porque ela me deixa decidir. Ela me deixa estar onde quer que eu esteja. Mas ela nao me deixa sentir. Ela nao me dá tempo para sentir. Ela quer que eu pense e decida. Decida e faça. Que eu seja alguém que faz.

Eu nao sei onde eu estou. Eu reconheço o lugar, as pessoas, as linhas invisíveis de desejos e poderes, mas nao me vejo nessas linhas. Nao consigo alinhá-las às minhas linhas internas. O meu desejo paira em outro plano. E quando, por um breve instante, eu sinto o meu desejo coincidindo com as linhas invisíveis desse lugar estranho, me sinto ainda mais rara, porque falta alguma coisa, alguma coisa muito simples e fundamental. Alguma coisa que eu nao controlo. E eu me esforço para pensar que isso é bom e que o fato de a gente nao ter controle sobre as pessoas, o mundo e as coisas é genial e aí está toda a graça e extraordinariedade da vida. Mas daí eu me lembro que onde está toda a graça e a extraordinariedade da vida é também onde está toda a angústia e o desespero humano.

Ela continua ali. Ela se parece tanto comigo algumas vezes que eu chego a me confudir com ela. Porque sempre que ela está presente ela se parece comigo, ainda que algumas vezes se pareça mais que outras. Mas eu tenho que admitir que embora eu nutra carinho por ela, os melhores momentos da minha vida foram quando eu nao podia sentir sua presença e, por isso, nao podia identificar-me com ela. Momentos de liberdade e de leveza. Momentos no qual me conecto com o que há de mais verdadeiro em mim e em tudo que me rodeia. E o mais incrível desses momentos é que eles simplesmente são. Nao há esforço, nem dor. Nao há exigencia, nem medo. Nao há pressa. Nao há pressao. Nao há perigo. Nao há nada que se possa medir ou pensar.

Mas ela continua ali e eu preciso decidir. Eu preciso decidir se continuarei permitindo essa afronta. Se eu seguirei respondendo aos seus apelos, fortalecendo-a e a deixando controlar minha vida. NAO. Eu NAO POSSO seguir assim. NAO, senhora-consciencia-interna-duvidosa, eu NAO LHE QUERO MAIS. Nao, senhora-meio-inteligencia-interior, eu NAO POSSO MAIS com a senhora. Nao, senhora-dúvida-monstrusosa-e-radicalmente-racional, eu NAO CONSIGO VIVER COM A SUA PRESENÇA. Entao, senhora-falsa-decidida-egocentrica-insegura-mente, vá embora e feche a porta.

2 comentários:

gui disse...

Lindo o texto/poesia, ju, me admiro com a qualidade dos textos do teu blog, deverias publicar algo. A proposito, este texto me lembrou esta comic aqui: http://www.viruscomix.com/page540.html
bjus.

Juliana Ben disse...

Gracias, Gui! Tua opiniao é importante pra mim, pois escreves de putamadre! Quero muito publicar algo e sim, creio que o farei em breve. Assim que tenha mais material. Meu nivel de ingles pré-intermediário me impede de entender tudo q está nos quadrinhos q me enviaste, mas o que me chegou eu gostei e me identifiquei muito tb. E como vao teus projetos literários? Adoraria ler teus novos textos.
Um beijo grande.